Comunicação do Ministro das Finanças
«Para a apresentação da Proposta do Orçamento do Estado para 2013, foi decisivo o esforço desinteressado dos trabalhadores do Ministério das Finanças que trabalharam longas horas, durante muitos dias seguidos, para permitir o cumprimento dos prazos legais para a apresentação da Proposta do Orçamento do Estado para 2013. Nas condições atuais o exercício é ainda mais pesado dada a necessidade de contacto constante com os nossos parceiros internacionais.
Quero deixar aqui o meu agradecimento aos trabalhadores do Ministério de que me honro de fazer parte. Quero em particular agradecer aos funcionários do GPEARI, da Direção Geral do Orçamento, da Direção Geral do Tesouro e Finanças e aos funcionários da Entidade de Serviços Partilhados que asseguraram o suporte informático imprescindível a este exercício.
1. O Enquadramento do OE2013
Portugal atravessa um episódio difícil da sua história. Os desequilíbrios acumulados ao longo de décadas impõem um ajustamento muito exigente e persistente. Para completar este processo temos de manter o rumo.
Importa recordar que já alcançámos progressos significativos. Para 2013 prevemos um excedente da balança corrente, o que não acontecia há 20 anos. Este excedente deve-se sobretudo ao comportamento das nossas exportações. Isto mostra que estamos a fazer uma transição de um modelo de crescimento - baseado na procura interna - para um modelo mais assente nas exportações. Fizemos também progressos notáveis na redução do endividamento das famílias e das empresas e os nossos bancos estão numa situação financeira mais forte. Ao nível das contas públicas, o ajustamento foi também muito significativo. Concretizámos uma correção significativa dos desequilíbrios que se verificavam no início do Programa. Nos últimos meses, Portugal tem vindo a acumular credibilidade e confiança nos mercados internacionais, permitindo perspetivar um regresso ao financiamento de mercado.
O caminho que temos que percorrer não é fácil. Dada a dureza da situação é natural que neste momento surjam receios e incertezas quanto ao sucesso do Programa de Ajustamento. Note-se, contudo, que esta difícil situação é transitória e decorre da natureza do ajustamento que temos que fazer. Mas recuar agora e desperdiçar todo o esforço que fizemos para acumular credibilidade externa seria incompreensível.
Claro que em situações difíceis pode parecer que abrandar o ritmo permitiria um ajustamento menos oneroso para todos. Quero destacar que o Governo e as organizações internacionais reconheceram precisamente este aspecto no quinto exame regular do programa de ajustamento ao reverem os limites quantitativos para o défice orçamental que passaram para 5.0% em 2012, 4.5% em 2013 e 2.5% em 2014. Contudo, o nível da dívida pública, que vai aumentar acima dos 120 por cento do PIB em 2013, não permite qualquer margem adicional. Sejamos claros: a revisão dos limites só foi possível, após um árduo processo de negociação com as instâncias internacionais, devido ao capital de credibilidade e confiança que acumulámos no cumprimento escrupuloso do programa de ajustamento. De fato, esta Proposta de Orçamento para 2013 é a única possível na sequência do quinto exame regular. Não temos qualquer margem de manobra. Pôr em causa o Orçamento é pôr em questão o próprio Programa de Ajustamento. Todo o capital de credibilidade será perdido se rejeitarmos o Programa ou procurarmos alterar os seus parâmetros fundamentais. A concretizar-se esse cenário, não seria só o nosso futuro que ficaria em causa. Seria imediatamente testada a viabilidade do presente de Portugal.
Pedir mais tempo, abrandar o ritmo, é o desejo de muitos nesta altura a fazer sacrifícios. Mas quem pretende tal cenário tem de explicar como esse adiamento será financiado? Quem nos emprestará mais dinheiro? Quanto irá crescer a dívida pública? Com uma dívida pública crescente, e juros absorvendo uma percentagem crescente das receitas, que cortes fará no futuro: em prestações sociais, vencimentos dos funcionários públicos, educação, saúde, justiça, segurança, defesa e outras funções do Estado? Pedir mais tempo, seria optar por um alívio momentâneo que rapidamente se esgotaria e que acabaria por nos conduzir à ditadura da dívida e, portanto, ao fracasso. Recuar não é uma boa opção.
Claro que há também quem advogue simplesmente não pagar a dívida. Os resultados nos países que enveredaram por esta via falam por si. Os custos desta opção são tão brutais que um país responsável tudo deve fazer para evitar este cenário. Felizmente Portugal fez o suficiente para tornar este cenário catastrófico numa hipótese remota.
De fato, as soluções supostamente mais fáceis encaminhariam Portugal para um ciclo vicioso de perda de credibilidade, dificuldade de acesso a financiamento, agravamento da crise económica e instabilidade política e social. Temos que continuar a executar o programa de ajustamento de forma coesa e consistente. Esta é a alternativa que nos conduzirá ao ciclo virtuoso de credibilidade acrescida, acesso ao financiamento, e recuperação da atividade económica e do emprego.
É importante explicar porque é que a sustentabilidade das finanças públicas é tão difícil. Vivemos muito tempo com padrões de consumo e de despesa incompatíveis com os níveis de produção nacional. O resultado foi a acumulação de níveis de dívida excessivos que nos aproximaram da bancarrota. O fraco crescimento populacional, o envelhecimento da população e um baixo nível de crescimento económico dificultam a sustentação da dívida e do sistema de segurança social. Recordo que o nosso modelo de segurança social não é configurado com base num sistema de capitalização. Temos que tomar medidas que garantam a sua capacidade de funcionamento em relação às gerações futuras. As restrições que ignorámos durante anos são agora reais e severas. Os progressos recentes na construção da curva de rendimentos e no sucesso da operação de troca de dívida são inegáveis. Mas os problemas de financiamento não estão de todo resolvidos. Apenas mantendo a determinação e o esforço persistente, podemos retomar a independência financeira e a liberdade nas nossas escolhas cujo primeiro passo será a saída da Troika em junho de 2014.
O ajustamento orçamental é também uma obrigação de Portugal enquanto Estado-membro da União Europeia e país participante na área do euro. A continuidade do projeto europeu assenta na recuperação da estabilidade macroeconómica e financeira de forma a garantir a sustentabilidade e prosperidade a longo prazo. Este facto foi reconhecido pelos líderes europeus e está reflectido no novo quadro legislativo e institucional da União Europeia e da área do euro.
O Orçamento do Estado de 2013 é um marco importante neste caminho de acumulação de credibilidade. Passo agora a explicar os principais traços da proposta.
2. O Orçamento do Estado para 2013
Em 2013 o défice orçamental irá situar-se em 7,5 mil milhões de euros. Este valor corresponde a 4.5% do PIB, i.e. ao limite para o défice para 2013 aprovado na reunião do Eurogrupo e ECOFIN de 8 e 9 de Outubro passados.
Em 2013, o saldo primário (que exclui o pagamento de juros) ficará próximo do equilíbrio, em -0.2% do PIB. Já o saldo estrutural primário (que exclui os juros da dívida pública e é corrigido do ciclo económico e de fatores temporários) verificará um excedente de 1,9% do PIB. No período 2011-2013 teremos feito um ajustamento orçamental em Portugal de cerca de 7.5 p.p. do PIB. Este é um desenvolvimento que não tem precedente na história recente da nossa economia. O esforço de ajustamento persistirá até 2015, altura em que teremos alcançado o objetivo de médio prazo, i.e. um défice estrutural das administrações públicas inferior a 0.5% do PIB.
Para respeitar o limite acordado para o défice em 2013 serão tomadas medidas de consolidação orçamental que totalizam cerca de 3.2% PIB. Deixem-me recordar que destas medidas cerca de dois terços já estavam associadas ao Programa de Ajustamento.
Para além destas medidas foi necessário encontrar um conjunto de medidas substitutivas das consideradas inaplicáveis a partir de 2013 pelo Tribunal Constitucional.
2.1 Medidas substitutivas dos artigos 21.º e 25.º da Lei do Orçamento do Estado para 2012
Como já tinha anunciado no passado dia 3 de Outubro, será reposto aos funcionários públicos o subsídio de Natal, mantendo-se a suspensão do subsídio de férias. Para os pensionistas e reformados será reposto o subsídio de Natal e 10% do subsídio de férias, mantendo-se suspenso o pagamento de 90% do subsídio de férias. Saliento que a suspensão parcial do subsídio de férias não afeta cerca de 90% dos pensionistas da Segurança Social. A suspensão do pagamento do subsídio de férias será aplicada nos moldes de 2012 (não se aplica abaixo dos 600 euros mensais; aplica-se progressivamente entre os 600 e 1100 euros e na totalidade acima dos 1100 euros). O aumento de despesa para o Estado que resulta destas reposições será compensado por medidas de carácter fiscal.
2.2 Medidas do lado da receita
A Proposta de Orçamento do Estado para 2013 inclui um conjunto abrangente de medidas de consolidação orçamental do lado da receita com um impacto estimado de aproximadamente 4.300 milhões de euros (incluindo o efeito da reposição parcial dos subsídios).
Quero, no entanto, desde já salientar que estas medidas tiverem o objetivo deliberado de assegurar uma distribuição mais equitativa no esforço de consolidação orçamental entre:
i) sector público e sector privado, por um lado; e
ii) rendimentos do trabalho e rendimentos de capital, por outro.
A repartição equitativa do esforço entre o sector público e sector privado será alcançada por via dos impostos diretos, com particular incidência no IRS. A repartição equitativa do esforço entre rendimentos do trabalho e do capital será garantida pela introdução de elementos adicionais de tributação sobre o capital e o património.
Passo agora a expor as medidas relativas ao IRS, dada a sua relevância no total de medidas do lado da receita em 2013.
Em concreto, o aumento da taxa média efetiva resultante: i) da alteração da estrutura de taxas e de escalões do IRS, ii) da introdução de uma sobretaxa de IRS e iii) da manutenção da taxa de solidariedade ao último escalão de rendimentos.
O número de escalões do IRS será reduzido dos atuais 8 para 5. Convém salientar antes de mais que as taxas marginais de imposto são as que se pagam por cada unidade de rendimento acima do limite definido para cada escalão. A taxa efetivamente paga por cada indivíduo é a taxa média. Esta é a taxa relevante em termos de arrecadação de receita de IRS por parte do Estado. Devo salientar que Portugal apresenta um nível de tributação em sede de IRS dos mais baixos da Europa.
Com a alteração da estrutura de escalões e de taxas, a taxa média efetiva do IRS passa de 9.8% para 11.8%. Acrescentando a sobretaxa de IRS de 4% - que se aplica ao rendimento coletável que excede o salário mínimo - e a taxa de solidariedade de 2.5% no último escalão, a taxa média efetiva do IRS aumenta para 13.2%.
As alterações introduzidas tiveram a preocupação de salvaguardar as famílias de mais baixos rendimentos através da manutenção do mínimo de existência.
Adicionalmente, o agravamento do IRS foi desenhado de forma a aumentar significativamente a progressividade deste imposto: o esforço contributivo cresce mais depressa do que a capacidade contributiva.
Esta alteração conduz assim a uma distribuição mais equitativa do rendimento em Portugal. Note-se que o IRS verá a sua progressividade reforçada. Em qualquer caso, cerca de 20% dos contribuintes com salários mais altos continuarão a pagar cerca de 80% da receita de IRS.
2.3 Medidas do lado da despesa
A proposta de Orçamento do Estado para 2013 inclui um conjunto alargado de medidas de corte de despesa. O esforço de poupança é muito significativo: serão executadas medidas no total de aproximadamente 2.700 milhões de euros. Porém, o aumento de despesa decorrente da reposição parcial de subsídios aos funcionários públicos e pensionistas - valor de cerca de 1.700 milhões de euros - irá absorver quase dois terços deste montante.
Quero destacar as medidas com maior impacto orçamental
• Ao nível da Administração Pública, será continuado o esforço de contenção nas despesas com pessoal. Destaca-se a redução do número de efetivos em 2%; a diminuição do número de trabalhadores com contratos a termo; e a redução da compensação por horas extraordinárias. Os custos com pessoal serão assim reduzidos em cerca de 630 milhões de euros.
• Os recursos do Estado serão também fortemente racionalizados. Destaca-se o esforço de redução dos encargos brutos com as Parcerias Público-Privadas no montante de pelo menos 250 milhões de euros apenas em 2013. Adicionalmente, é de salientar a redução das transferências para fundações em 40 milhões de euros.
• Também no Setor Empresarial do Estado existirão fortes medidas de contenção de custos. No seu conjunto, a redução de investimentos e a diminuição das transferências do Estado para as empresas públicas atingem um valor estimado de 290 milhões de euros.
• No âmbito da proteção social, serão levadas a cabo medidas na Segurança Social e na Caixa Geral de Aposentações no valor de aproximadamente 1.000 milhões de euros. De entre estas, destaca-se a redução de pensões nos mesmos moldes da redução salarial aplicada aos funcionários públicos em 2011, com impacto de aproximadamente 420 milhões de euros. As restantes poupanças decorrerão de alterações às prestações sociais, com a preocupação de garantir que os cada vez mais escassos recursos financeiros do Estado são direcionados para aqueles que efetivamente mais precisam.
• No setor da saúde serão tomadas medidas que conduzem a poupanças de cerca de 180 milhões de euros. A maior parte virá da prossecução das reformas na área do medicamento, reduzindo as rendas no setor. Haverá ainda poupanças de cerca de 240 milhões de euros nos Hospitais EPE, que não tendo impacto no saldo orçamental, serão fundamentais para reduzir o seu défice operacional.
• Na educação e ciência, haverá um esforço de redução de despesas de funcionamento e investimento no valor de 160 milhões de euros.
• Serão também tomadas muitas outras medidas de redução de despesas de funcionamento nas restantes áreas sectoriais. Este esforço vale aproximadamente 100 milhões de euros.
Quero salientar, que estas medidas fazem parte do processo de identificação de cortes estruturais na despesa. Como referi em ocasiões anteriores, estão a ser identificados cortes de despesa que totalizarão 4.000 milhões de euros em 2013 e 2014. Uma parte deste esforço adicional deverá ser concretizada ainda em 2013.
3. Conclusão
O Orçamento do Estado para 2013 é um orçamento difícil para os portugueses. O aumento da carga fiscal no próximo ano é muito significativo. Não deixa, no entanto, de ser um orçamento mais justo no sentido da repartição equitativa do esforço adicional que é pedido aos portugueses na medida em que todos os rendimentos são tributados e de uma forma mais alargada e mais progressiva.
Mas o acesso do país e das empresas aos mercados financeiros neste Outono dão-nos motivos para antever um aumento da disponibilidade de financiamento na economia e a custos de financiamento mais baixos. Neste sentido é importante resolver o problema do mau funcionamento da transmissão da política monetária e da fragmentação do sistema financeiro europeu. A resolução destes problemas, que têm uma dimensão europeia, reduziria os obstáculos à competitividade das nossas empresas.
Este é um exemplo que aponta para a probabilidade de um ciclo virtuoso de credibilidade acrescida, acesso ao financiamento e redução de incerteza. No quadro do cumprimento do Programa beneficiamos de mecanismos de seguro no processo de regresso aos mercados de obrigações (por parte dos nossos parceiros europeus e por parte do BCE). Como em 1983-85 estamos a criar condições para um ciclo de prosperidade e de recuperação do crescimento, investimento e emprego no quadro da integração de Portugal na Europa e do aprofundamento da integração europeia. A visão é a de um Portugal moderno, aberto, com oportunidades para todos, democrático, estável e um exemplo de sucesso a nível europeu.
As alternativas de um segundo Programa ou da reestruturação da dívida têm associados riscos muito sérios. Em particular o colapso da credibilidade junto dos credores conduziria a dificuldades de acesso ao financiamento e criaria instabilidade e incerteza. A disponibilidade de mecanismos de seguro seria incerta. A probabilidade de concretização de um ciclo vicioso aumentaria com o aprofundamento da queda do investimento, do emprego e da atividade económica. Deixaríamos de ter capacidade para participar ativamente no debate europeu e internamente estaríamos sujeitos a uma prolongada tutela por parte dos nossos credores.
Em período de crise existem duas alternativas: ou a crise é gerida pelo sistema político ou o sistema político é subvertido pela crise. Concretizar o ciclo virtuoso é difícil. Os riscos, incertezas e imprevistos são inevitáveis. O processo exige a persistência e a resistência de uma maratona. A escolha é clara.
Muito obrigado.»